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Avaliação de conhecimentos sobre a temática de Tráfico de Seres Humanos. Desmistificar ideais pré-concebidas acerca do tema em causa.
Copy - Copy - Facto/Mito
As vítimas de tráfico de seres humanos estrangeiras são, frequentemente, percecionadas como pessoas que violam as leis de imigração e que se encontram no país em situação irregular. Contudo, muitas das vítimas são cidadãos/ãs europeus/eias que, dentro da União Europeia, não precisam de autorização de residência ou de trabalho. Há ainda migrantes que, não pertencendo a países da União Europeia, atravessam as fronteiras legalmente, na posse dos documentos necessários, podendo ser fornecidos, ou confiscados posteriormente, pelo/a traficante.
Os/as traficantes podem ser da mesma família e/ou pertencer ao círculo de contactos da vítima, sendo, frequentemente, pessoas da sua confiança. Podem, inclusivamente, viver e/ou trabalhar com elas. Na fase do recrutamento, os/as traficantes tendem a ser vistos não como criminosos/as, mas como aliados/as para a concretização de um objetivo, por exemplo, para a obtenção de um emprego num país estrangeiro. Isto acontece porque quem trafica é, não raras vezes, próximo das vítimas e consegue manipulá-las de forma ardilosa, mostrando-se disponível para as ajudar na concretização do projeto migratório e auxiliando em questões como a preparação das viagens e da documentação. Salienta-se ainda que os/as traficantes podem, também, ter sido vítimas de tráfico de seres humanos juntamente com outras vítimas, assumindo, depois, o papel oposto como forma de lucrar financeiramente.
Quem favorecer ou facilitar, por qualquer forma, a entrada, a permanência ou o trânsito ilegal de cidadão/ã estrangeiro/a em território nacional, com intenção lucrativa, comete o crime de auxílio à imigração ilegal e é punido com pena de prisão de um a cinco anos (artigo 183º, alínea 2, da Lei n.º 29/2012, de 9 de agosto). O tráfico de pessoas é diferente do auxílio à imigração ilegal, ainda que estes crimes possam, por vezes, estar interligados. As principais diferenças incidem no facto de o tráfico de seres humanos ser um crime contra a liberdade pessoal, inserido nos crimes contra as pessoas, e o auxílio à imigração ilegal ser um crime contra o Estado. O auxílio à imigração ilegal não pressupõe a limitação da liberdade da pessoa no país de destino, contrariamente ao que acontece no tráfico de seres humanos, em que a liberdade pessoal é condicionada. Enquanto o tráfico de seres humanos tem como fim a exploração da pessoa, e o seu consentimento é inválido, o auxílio à imigração ilegal tem como finalidade a obtenção de benefícios financeiros ou materiais, validando-se o consentimento da pessoa. Neste caso, a pessoa dá o consentimento para transpor a fronteira ilegalmente, sendo considerada “cliente” que paga o serviço. Para que se configure o crime de tráfico de seres humanos não é necessária a transnacionalidade, contrariamente ao que acontece com o auxílio à imigração ilegal, que pressupõe a transposição de uma fronteira internacional.
O recrutamento de potenciais vítimas de tráfico de seres humanos pode envolver violência ou outras formas de coação física, mas nem sempre. Algumas pessoas são raptadas, ameaçadas e outras são aliciadas de forma ardilosa ou fraudulenta com falsas promessas de trabalho, de melhores condições de vida e/ou de relações amorosas. É recorrente os/as recrutadores/as atuarem através das redes sociais da internet, de anúncios de jornais, de agências de emprego, de turismo, de supostas agências de moda e/ou de associações desportivas. A vitimação pode ainda acontecer através de abuso de autoridade e do aproveitamento da incapacidade psíquica ou de situação de especial vulnerabilidade da pessoa, conforme indica o artigo 160.º do Código Penal Português.
As pessoas podem ser vítimas de tráfico de seres humanos dentro do seu país de residência, sem ser necessária a sua deslocação para um país externo. Assim, o tráfico de pessoas pode ser interno, podendo a vítima ser traficada de uma cidade/região para outra, ou mesmo dentro da mesma cidade/região.
Homens e mulheres adultos, bem como jovens e crianças, de qualquer país do mundo e de todas as classes socioeconómicas podem ser vítimas de tráfico de seres humanos. Não existe um perfil definido de vítima de tráfico de seres humanos, mas é um facto que os traficantes tendem a detetar e a aproveitar-se de algumas vulnerabilidades. Assim, há grupos de pessoas que podem correr maior risco de vitimação, como os homens e mulheres no negócio da prostituição, pessoas com incapacidades mentais, pessoas em situação socioeconómica precária e/ou pouco alfabetizadas, pessoas em situação de desemprego e/ou sem abrigo, trabalhadores/as migrantes, pessoas com problemas de dependências, crianças e jovens desacompanhados/as e/ou ativos/as nas redes sociais da internet.
De acordo com o artigo 160.º do Código Penal Português, o crime de tráfico de pessoas pode ter como fins a exploração sexual, a exploração do trabalho, a mendicidade, a escravidão, a extração de órgãos ou a exploração de outras atividades criminosas. Atendendo ao último relatório da agência das Nações Unidas para a Droga e Crime (UNODC), dos 24 mil casos de tráfico de seres humanos registados por 142 países, 59% são referentes a exploração sexual (inclui a prostituição, pornografia, serviços sexuais forçados, entre outros), atingindo em maior número vítimas do sexo feminino. No entanto, em Portugal, quanto aos casos de tráfico de pessoas sinalizados e confirmados, verifica-se um maior número de casos de tráfico para exploração laboral do que sexual, atingindo maioritariamente vítimas do sexo masculino, conforme os dados apresentados no Relatório do Observatório de Tráfico de Seres Humanos (OTSH) de 2018.
O consentimento dado pela vítima de tráfico de seres humanos, tendo em vista qualquer tipo de exploração, é irrelevante para que a ação se circunscreva no crime de tráfico de pessoas se tiver sido usado qualquer um dos seguintes meios: violência, rapto, ameaça grave, abuso de autoridade, ardil ou manobra fraudulenta, aproveitamento da situação de especial vulnerabilidade. Nenhuma pessoa consente, voluntariamente, ser explorada, pelo que o consentimento é irrelevante por ter sido obtido através de abuso da vulnerabilidade do/a trabalhador/a.
De acordo com a legislação portuguesa, o tráfico de pessoas é um crime público, o que significa que qualquer pessoa tem o poder e o dever de o denunciar. Caso testemunhe ou desconfie de uma presumível situação de tráfico de pessoas, contacte as entidades competentes nesta matéria, nomeadamente os órgãos de polícia criminal. A sinalização de uma presumível vítima permitirá a sua assistência e proteção, podendo desencadear a sinalização e a libertação de outras vítimas. A sinalização é crucial para identificar e condenar os/as traficantes, quer estejam, ou não, organizados/as em redes criminosas
O tráfico de pessoas, segundo o artigo 160.º do Código Penal Português, é um crime contra a liberdade pessoal, configurando-se como um crime contra a liberdade de decisão e de ação. Algumas vítimas são exploradas em locais escondidos ou privados, sendo possível que sejam trancadas. No entanto, a maioria das vítimas de tráfico de seres humanos é exposta ao mundo exterior. Podem ser vítimas deste crime, por exemplo, pessoas que se encontram a mendigar nas ruas, agricultores/as que trabalham em terrenos próximos, funcionários/as de hotéis, da restauração e/ou da construção civil, prostitutos/as de rua ou de casas de alterne. Muitas destas vítimas contactam com outras pessoas e acedem a serviços públicos, como por exemplo os centros de saúde ou hospitais. Por isso, importa saber detetar possíveis indicadores de situações de tráfico de pessoas e sinalizar as presumíveis vítimas, conforme as orientações do Sistema de Referenciação Nacional de Vítimas de Tráfico de Seres Humanos.
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